“Temos, porém, este tesouro em vasos de barro, para que a excelência do poder seja de Deus e não de nós. Em tudo somos atribulados, porém não angustiados; perplexos, porém não desanimados; perseguidos, porém não desamparados; abatidos, porém não destruídos (…). Por isso, não desanimamos; pelo contrário, mesmo que o nosso homem exterior se corrompa, contudo, o nosso homem interior se renova de dia em dia” (2Co 4.7-9 e 16).
INTRODUÇÃO:
O Apóstolo Paulo inicia o capítulo 4, da segunda carta aos Coríntios, afirmando: “Pelo que, tendo este ministério, segundo a misericórdia que nos foi feita, não desfalecemos” (v. 1). A razão para não desfalecermos/ desanimarmos, diante das lutas da vida, sempre será a “misericórdia de Deus”, revelada no Evangelho (Graça) de Cristo (“ministério” – v. 1/ 2Co 3.8). De fato, estamos cercados por inúmeras circunstâncias ruins, o tempo todo (2Co 4.8-9), e, Paulo, inclusive escreveu que quando chegou à Macedônia “em tudo fomos atribulados: lutas por fora, temores por dentro” (2Co 7.5). Isso tudo destaca a fragilidade humana (medo/ fraqueza), diante das tribulações da vida.
Deus permite que sejamos provados e tentados, as vezes até ao limite (2Co 1.8-9), a fim de aprofundar nossa dependência Dele e mudar nosso caráter (aperfeiçoar a imagem de Jesus – 2Co 3.18), entre outros. O segredo para resistirmos tudo, sem murmurar ou desfalecer, é o próprio Deus (“…a nossa suficiência vem de Deus” – 2Co 3.5). Então vejamos na sequência, como nos apossamos desse “segredo”, para encarar os desafios da vida sem desanimar.
Proposição: Deus tem uma “porção de graça” para liberar sobre nós a cada dia, bastando apenas que a busquemos diligentemente.
1- SOMOS COMO UM “VASO DE BARRO”, SIMPLES E FRÁGIL
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Antes de citar alguns tipos de lutas que o crente está sujeito a enfrentar neste mundo, Paulo faz a seguinte afirmação a respeito da fragilidade humana: “Temos, porém, este tesouro em vasos de barro, para que a excelência do poder seja de Deus e não de nós” (2Co 4.7). O Apóstolo usa a figura do “vaso de barro”, provavelmente olhando para um “pote de argila” cheio de água potável. Um pote de barro é muito comum, sem valor monetário, fraco e descartável.
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Nossa estrutura física é de fato fraca, e carece de muitos cuidados. No capítulo seguinte (5.1), Paulo ilustra o nosso corpo físico como uma “casa terrestre”, que um dia vai se desfazer. Todos essas figuras servem para revelar quão dependentes da graça e do amor de Deus nós somos. Humildade é a virtude cultivada pelos cristãos que reconhecem sua fragilidade e a nulidade da chamada “autosuficiência”, porque sem Jesus Cristo estamos irremediavelmente perdidos (Jo 15.5).
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Essa vulnerabilidade representada pelo “vaso de barro”, também revela as nossas limitações ou pouca força, porque nos versículos seguintes (8 e 9), Paulo fala das situações ruins que estamos sujeitos, que se não fosse o “poder de Deus” (v. 7), seríamos completamente destruídos. Quantas vezes nós ficamos tristes (abatidos), desnorteados (sem perspectiva), doentes emocional ou fisicamente falando? Mas é justamente o reconhecimento dessa fraqueza ou insuficiência que abre a porta para a ação de Deus (“A minha graça te basta” – 2Co 12.9).
2- ESTAMOS SUJEITOS A INÚMERAS SITUAÇÕES RUINS AO LONGO DA VIDA
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Depois de descrever a fraqueza humana pelo uso da figura de um vaso de argila, Paulo apresenta quatro situações, que representam formas de lutas que estamos sujeitos neste mundo em razão do pecado. Essa lista pode ser seguramente, ampliada muitas vezes. Vejamos, por exemplo, as terríveis lutas que Paulo enfrentou para levar o Evangelho de Cristo: “Até à presente hora, sofremos fome, e sede, e nudez, e somos esbofeteados, e não temos morada certa” (1Co 4.11).
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O fato de sermos cristãos professos não nos isenta do sofrimento (Jo 16.33), as vezes é esse fato que deverá produzir lutas (Rm 8.17). Portanto, o primeiro teste que Deus pode permitir é: “Em tudo, somos atribulados, porém não angustiados” (2Co 4.8). Paulo emprega a palavra grega “thlibomenoi”, que deriva de “thlibo”, e fala de “sofrer aflição, padecer de. Tem referência a sofrimentos devido à pressão das circunstâncias ou ao antagonismo das pessoas” (Dicionário Vine).
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Em seguida vem: “perplexos, porém não desanimados” (v. 8). Uma tradução moderna verteu esta frase em: “Algumas vezes ficamos em dúvida, mas nunca ficamos desesperados” (NTLH). O verbo grego “aporéo” pode ser traduzido por: “estar em dúvida, estar perplexo. Nos papiros era usada para alguém arruinado pelos seus credores e contemplava seu fim” (Vida Nova; 1995; p. 343). Tem situações que nos “paralisa”, e não conseguimos nem esboçar reação alguma.
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A terceira situação é descrita nos seguintes termos: “perseguidos, porém não desamparados” (2Co 4.9). Neste ponto Paulo emprega a palavra “diokomenoi”, do verbo grego “dioko”, perseguir, caçar como a um animal. Numa ocasião mais de 40 judeus pactuaram para tirar a vida de Paulo “sob anátema” (At 23.12-14). Há várias formas de perseguição (ex: preconceito, inveja/ ciúmes etc.), mas a Bíblia diz que Deus nunca desampara seus filhos (Dt 31.8; Mt 28.20).
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O último da lista, é talvez o pior deles, é o seguinte: “abatidos, porém não destruídos” (v. 9). O verbo grego empregado pelo Apóstolo Paulo é “kataballo”, lançar abaixo, derrubar violentamente. Esta palavra descreve o que ocorre numa luta corpo a corpo, quando o oponente é derrubado por ter sido atingido ou ferido mortalmente. Nesta hora se destaca o poder de Deus, que é capaz de “ressuscitar mortos” (2Co 1.9), de nos restaurar completamente de uma situação aparentemente insolúvel ou irremediável (ex: 2Co 1.8-10).
3. A BÍBLIA REVELA O SEGREDO PARA VENCERMOS AS CIRCUNSTÂNCIAS RUINS DA VIDA
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Antes de finalizar o capítulo 4, Paulo parece dizer que as lutas da vida podem nos fazer parar, desistir, desanimar se não tivermos o cuidado de fortalecer nossa vida espiritual: “Por isso, não desanimamos; pelo contrário, mesmo que o nosso homem exterior se corrompa, contudo, o nosso homem interior se renova de dia em dia” (2Co 4.16). A expressão “homem exterior” é mais uma referência ao corpo, que inevitavelmente sofre um processo continuo e irreversível de “destruição” (“diaftheiretai”), ou decomposição (5.2).
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Podemos afirmar, pelo estudo do contexto, que as circunstâncias externas negativas da vida, trabalham para enfraquecer o homem física e emocionalmente, e só podemos fazer frente a elas por meio do “tesouro” guardado dentro de nós (2Co 4.7), que alguns creem ser o “conhecimento da glória de Deus, na face de Cristo” (2Co 4.6), mas esse “tesouro” é “…Aquele (Espírito Santo) que ressuscitou o Senhor Jesus” (2Co 4.14). Portanto, o próprio Deus é o segredo para vencermos nossas limitações e situações negativas da vida (Fp 4.13).
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Jesus esteve com seus discípulos 24 horas por dia, e quando chegou a hora de encarar a cruz e voltar para o Pai, Ele prometeu o seguinte para eles: “E eu rogarei ao Pai, e ele vos dará outro Consolador, a fim de que esteja para sempre convosco, o Espírito da verdade, que o mundo não pode receber…” (Jo 14.16). Pouco depois de ressuscitar Jesus confirmou sua promessa dizendo: “Mas recebereis poder, ao descer sobre vós o Espírito Santo…” (At 1.8). Esse é o “tesouro” que mora dentro de cada cristão nascido de novo (Rm 8.9).
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Não importa como as coisas estão “pelo lado de fora” do nosso ser, desde que o nosso compromisso, devoção, comunhão, fé e amor esteja sempre se renovando (dia a dia) com Deus. O verbo renovar (“anakainoo”) no original grego está conjugado no presente, indicando renovação contínua. Não podemos descuidar, mas usar diariamente os “instrumentos” de renovação espiritual que Deus criou para nós, como o estudo da Palavra, a oração, o culto racional e o louvor a Deus.
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Precisamos ser “cheios do Espírito” (Ef 5.18), ou transbordantes Dele. Sua influência ou ação precisa afetar nosso estilo de vida nos mínimos detalhes (ex: pessoal, familiar, fraternal, social etc.), a tal ponto de moldar nosso caráter à semelhança de Cristo (2Co 3.18; Gl 5.22-23). Aqui está o “segredo da resistência”: renovação diária com Deus. Paulo já havia aconselhado os crentes de Éfeso a “sede fortalecidos nos Senhor e na força do seu poder” (Ef 6.10), e é justamente o Espírito Santo que nos fortalece e anima se tivermos o cuidado de nos “achegarmos a Deus” dia-a-dia (Tg 4.8).
CONCLUSÃO:
Jesus nunca escondeu de seus discípulos o “custo e o risco” que eles teriam que pagar para segui-lo (Lc 14.25-33). Da mesma forma, o texto em estudo revelou que estamos sujeitos às inúmeras situações ruins durante a nossa jornada de vida neste mundo. Inclusive o salmista Davi escreveu: “Muitas são as aflições dos justo, mas o Senhor de todas os livra” (“socorre” – Sl 34.19). Portanto, o Senhor é o segredo para nossa resistência às lutas da vida, e renovar nossa devoção a Ele todos os dias, por meio de vida devocional, é a posse desse segredo espiritual.
Pastor Walter Bastos